sexta-feira, abril 28, 2006

 

Vale mais tarde que nunca

A Igreja admite finalmente a utilização do preservativo como meio de prevenir a Sida.
Se há casos, como o do aborto, em que se pode falar de atitudes suportadas em posições ideológicas ou filosóficas, o caso da utilização do preservativo é apenas uma questão de inteligência ou da falta dela.
Por mais fiéis que sejamos às nossas convicções, não podemos por isso assumir posições que em si mesmas negam o óbvio ou criam contradições com valores que se pretende defender.
A Igreja sempre teve destas coisas, sempre olhou o homem como um ser ideal e não como um ser real, com as suas fragilidades e susceptibilidades. Esquecê-las, coloca a Igreja numa posição de alheamento das realidades, de afastamento dos crentes ou de contradição entre a prática e a fé.
Apesar de a afirmação agora produzida já constituir um passo no sentido do arejamento, acaba por se traduzir numa no cravo e outra na ferradura: apenas se admite dentro do casamento.
Para a Igreja, o sexo não existe a não ser como prática conjugal e apenas para reprodução. E no entanto…
O que vale é que ninguém liga muito àquilo que dizem e o pessoal continuará a fazer a vida que sempre fez, com ou sem o beneplácito da Igreja.
Depois queixam-se que há uma crise de vocações!
Que Deus os abençoe com o dom da clarividência.

quinta-feira, abril 27, 2006

 

Ingratidão

Há muito tempo não praguejava tanto em frente à televisão. Aliás, só me lembro de praguejar assim quando deparo com as touradas rodoviárias dos neuróticos do volante.
Refiro-me à reportagem das cerimónias de comemoração do 25 de Abril na Assembleia da República.
Em dada altura saúdam-se os capitães de Abril. Toda a Assembleia aplaude, com excepção dos representantes do PSD e CDS.
Ando há dois dias a tentar entender, arranjar uma justificação, do ponto de vista deles, para essa atitude. Não encontro uma que seja.
Para mim, o que se passou mais não foi do que o genuíno morder na mão de quem lhes dá o pão.
Esses ranhosos (e não serão só eles), não fosse um grupo de homens atirar-se para os cornos do touro, seriam obrigados a trabalhar no duro, como todos nós, não poderiam pirar-se para o Algarve antecipando férias de Páscoa e não receberiam “prendinhas” como fruto das manobras de influências. Leia-se “tráfico de influências”.
A avaliar pela qualidade geral do seu desempenho e pela irresponsabilidade que têm demonstrado, não lhes vislumbro grande sucesso se tivessem de se atirar à vida.
Significa isto que, aquilo que são, devem-no a esses homens a quem recusam a saudação.
Foram eles que lhes permitiram brincar ao poder, viajarem em carros pagos por todos nós quando exercem funções executivas, exercitarem a sua veia demagógica e chafurdarem em geral na gamela do poder. (Para quem não sabe, gamela é o nome dado nas Beiras ao recipiente em que comem os porcos).
Assim sendo, esta atitude só pode ser atribuída a ingratidão.
Já agora: Dr. Paulo Portas, a culpa do atraso e desgraça a que chegámos não é da Constituição, mas de tipos como V.Exa. que se deleita em pregar falsas doutrinas, exagerando ao limite o exercício da demagogia, pensando que o cidadão eleitor é parvo. Continue a brincar com o poder que pode ser que ainda chegue a Presidente da República.

quarta-feira, abril 26, 2006

 

Cenas do quotidiano

Local: hotel de cinco estrelas na zona nobre do Recife.
Dois portugas, da subespécie Gordus Extremus, acompanhados das respectivas mulheres, com pinta de pequenos empreiteiros ou pequenos negociantes de qualquer coisa, entram na sala do pequeno-almoço a escorrer, com os calções encharcados e alapam nas poltronas com almofadas de tecido.
Diz quem me acompanhava e estava de frente para os jeitosos, que se serviram alarvemente da vasta panóplia de fruta tropical, entre comentários de “não sabe a nada” e pratos de fruta não consumida.
Acrescente-se o pormenor típico da mastigação de boca aberta e estão os cromos detalhadamente caracterizados.
Moral da história: é pena o dinheiro, quando chega, vir sozinho.

quarta-feira, abril 12, 2006

 

Já bateu no seu filho hoje?

Alguns comentários e mails simpáticos que recebi dizem-me que este blog não é apenas meu. De certo modo estabeleceu-se aqui uma amizade virtual, feita de algumas bulhas (como com o passageiro da noite). Em breve aqui explicarei o que me levou a querer parar.
De momento, traz-me aqui a célebre decisão do Supremo Tribunal de Justiça que considera que bater numa criança, deficiente mental, ou fechá-la num quarto escuro, é um comportamento aceitável ou mesmo recomendável.
Mais, não o fazer poderá até configurar um crime de negligência!!!
A questão que se impõe é esta: quantos tabefes terei de dar no meu filho para não ser considerado negligente? E será que fechá-lo num quarto escuro será suficientemente adequado para obter um cidadão correctamente punido? Não será mais adequado um cubículo diminuto, bafiento, onde o puto nem se possa sentar?
O caricato da decisão não é inédito: há alguns anos, o mesmo STJ absolveu dois violadores de uma turista, por considerarem que esta os tinha provocado ao passear de mini saia «em pleno território de caça do macho ibérico» (estou a citar o acórdão).
Impõe-se agora que o STJ produza doutrina quantificando os tabefes, pontapés ou mesmo alguns murros, fazendo-os equivaler aos comportamentos dos miúdos.
Por exemplo: não comer a sopa – uma bofetada. Chegar a casa com as sapatilhas estragadas – dois murros. Ter uma negativa na escola – meia hora no quarto escuro. Duas negativas – uma hora. Não utilizar o autoclismo – dois pontapés.
Devem suas sapiências, prudentíssimos e experientes magistrados, também neste caso definir o máximo e o mínimo das penas a atribuir portas a dentro, na nossa gestão doméstica, sob pena de ficarmos todos numa imprevisibilidade jurídica pouco compatível com o estado de direito que estes senhores são pagos para defender.
E agora despeço-me, vou para casa ver se descubro se o meu puto cometeu algum acto punível à face de tão douta doutrina: tem de ser antes de almoço, não vá a gente enervar-se e ter algum problema digestivo.
Fica-me, apesar de tudo, uma angústia quase metafísica: quando for adulto, tiver vida própria e estiver longe de mim, como é que se comportará correctamente sem a ameaça da minha paternal punição?
Nota: e os professores? Também podem bater, na sua alta missão de educadores?

domingo, abril 09, 2006

 
Este blog termina aqui.
Nada vale a pena.

sexta-feira, abril 07, 2006

 

Fumar ou não fumar...

Antes de mais: sou fumador. Daqueles que fumam a sério, aproximadamente dois maços por dia.
Gostava de deixar de fumar. Um dia destes talvez consiga. Um dia destes talvez queira mesmo a sério.
Por ser fumador, estou à vontade para dizer aquilo que se segue.
Face à nova lei, que prevê a proibição de fumar em espaços públicos fechados, estão já a levantar-se reticências. Oiço agora na TSF que já há vozes que reclamam um período de transição, de adaptação.
Tretas.
Estive na Suécia há pouco mais de um mês. Lá, é proibido fumar em qualquer espaço fechado. Sem excepções. O único espaço livre para fumar é mesmo a rua. E nem se vêem avisos de proibição, pura e simplesmente é proibido e toda a gente sabe.
Nos hotéis só se pode fumar nos quartos, desde que estes sejam de fumadores. Em todas as áreas de utilização comum não existe espaço para fumadores.
Isto cria situações curiosas: à porta de cafés e restaurantes está o chão atapetado de piriscas, o que levou a que alguns estabelecimentos tenham colocado enormes cinzeiros metálicos junto das entradas.
Devo dizer-vos que não custa nada. É uma questão de hábito. Espera-se para fumar quando se sair. E mesmo eu, que sou fumador compulsivo, senti-me bem num edifício de restaurantes junto à Ópera de Estocolmo, sem fumo, apenas com o aroma dos diversos tipos de comida. O ambiente fica muito mais agradável. E sempre se poupam umas quantas fumadelas que inevitavelmente aconteceriam se não fosse a proibição.
Aqui há anos, num gelado mês de Dezembro, estive em Nova Iorque. Levei tabaco que dava à tangente para os dias que lá ia estar. Trouxe bastante mais de metade. Dentro dos edifícios não podia fumar, na rua o frio era de tal ordem que fumar era um martírio.
Significa isto que estas medidas resultam, quer para os fumadores diminuírem ou serem tentados a deixar de fumar quer em benefício dos que não fumam.
Mas a resistência nacional à mudança está já a manifestar-se. Parece até que somos o primeiro país a tomar esta decisão. Na Europa temos já os casos da Irlanda, Suécia e Espanha. E diga-se que aqui os nossos vizinhos fumam ainda mais que nós.
Durante anos fui daqueles que defenderam uma solução mansinha, que desse uma no cravo e outra na ferradura, que libertasse espaços fechados para fumadores.
Hoje, penso que todas as medidas que dificultem o vício são bem vindas, por muito que isso me custe.
E se me custa fazer uma viagem de oito horas de avião sem fumar…

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