quarta-feira, outubro 04, 2006

 

Sorte danada

Cada vez mais me convenço que o meu ano não foi bom para se nascer. Senão, vejamos.
Estava eu no primeiro ano da faculdade e levo com o 25 de Abril nas trombas. O resultado foi a maior peluda que se possa conceber, com o pessoal a fazer cadeiras em grupo de trabalho, passagens administrativas e outras rebaldarias. Conclusão: cá o rapaz quando chegou ao terceiro ano teve de estudar a sério as basezitas porque não se estava a entender com a coisa.
Dias felizes esses da revolução. Antevia-se um país moderno, inteligente, libertado do ambiente retrógrado de sacristia.
Afinal, prometeram-nos o céu e serviram-nos um purgatório de irresponsabilidades. Durante trinta anos ninguém nos disse que estávamos a caminhar alegremente para o buraco da falência. Ninguém nos avisou que tudo isto era transitório, que mais cedo ou mais tarde teríamos de redimensionar o país aos termos exactos daquilo que temos e somos.
Foram trinta anos de uma genuína feira de vaidades, de dinheiro fácil para alguns, de estímulo ao consumismo não sustentado para quase todos. Subimos bem alto e, agora, o trambolhão é enorme.
Tivesse eu nascido dez anos mais cedo e estaria agora com uma reforma por inteiro, rindo-me à socapa do maralhal que só vai poder reformar-se aos sessenta e cinco anos. E continuaria a trabalhar. Isso é que era qualidade de vida!
Já não bastavam as convulsões internacionais das quais directa ou indirectamente acabamos por ser vítimas, para ainda termos de nos debater com modificações internas profundas e, por vezes, difíceis de engolir.
Agora, vejo um país incapaz de sustentar os seus equipamentos sociais, de suportar os funcionários que admitiu – não tenho conhecimento que algum funcionário público tenha sido contratado por sua imposição – incapaz também de garantir sem sobressaltos um fim de vida digno para todos.
Entre a grande miséria dos tempos do fascismo e a situação que atravessamos, ainda vai uma grande distância. Por certo não voltaremos a esse ponto. Mas se este país não tomar juízo, não ficaremos muito longe.
A situação de perda de indústrias foi vivida pela Bélgica há dez anos e está agora a ser vivida pela França e Alemanha, mas nesses países tem-se uma noção exacta das funções do Estado. Nós encaramos o Estado como uma espécie de Pai que tem fontes de financiamento que nada têm a ver connosco e que tem a responsabilidade de nos pôr comida na mesa.
Pelo que me toca, já ficaria feliz se o Estado não gastasse 65% do meu IRS no seu próprio funcionamento e o transformasse em serviços prestados à comunidade.
Definitivamente, nasci num mau ano.

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