domingo, março 20, 2005

 

Estranho conceito

Refiro-me ao caso da cidadã americana que está em vida vegetativa há quinze anos, numa situação em que até a alimentação lhe é fornecida artificialmente.
O marido conseguiu obter uma autorização judicial para pôr termo a esta situação.
Não me vou alongar acerca daquilo que penso sobre o assunto porque já aqui escrevi sobre ele.
O que verdadeiramente me espanta, é este estranho conceito de vida defendido por alguns, segundo o qual o simples bater de um coração, ainda que desacompanhado de qualquer outra manifestação vital, é considerado como vida.
Considero que estamos perante um conceito reducionista de vida. Perante uma posição de fundamentalismo cultural, filosófico e religioso.
Os que assim pensam são os mesmos que condenam o aborto liminarmente e que o recusam mesmo quando a vida da mãe está em perigo, ou quando a vida que vai persistir se pode traduzir num martírio de sofrimento.
Este idealismo radical, completamente desligado de qualquer conteúdo prático, traduz-se, as mais das vezes, numa contradição com os valores que dizem defender de amor ao próximo e de respeito pela pessoa na sua integralidade.
Ouvi agora na televisão que até Bush, esse expoente máximo do pensamento contemporâneo, um dos raros exemplos vivos da reflexão filosófica, interrompeu o fim de semana para actuar por via legislativa por forma a impedir que o tubo de alimentação da mulher em causa seja retirado.
Não me revejo neste humanitarismo teórico, feito por metades, baseado numa sensibilidade que não entendo nem sinto.
Considero uma crueldade manter e perpetuar o sofrimento de alguém privado de tudo, excepto do bater do coração.
Tipos como Bush e os extremistas religiosos americanos, não entendem (nunca entenderão) a diferença entre ser e pessoa: persona, no sentido grego.
Se eu um dia ficar assim, por favor, desliguem-me a máquina: para mim, viver sem interagir com as pessoas e as coisas não é viver.
Respeitem o meu direito a querer ser mais do que uma couve ou um qualquer arbusto, que também estão vivos.

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